UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
DAGMAR JUNQUEIRA GUIMARÃES SILVA
APRESENTAÇÃO PARA O I EDIPE
OS CURSOS
DE MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS E DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE GOIÁS: HISTÓRIA E MEMÓRIA
Resumo: O presente artigo faz parte da dissertação de mestrado apresentada no Mestrado em Educação da Universidade Católica de Goiás (UCG) em 01/10/2003 que teve como objeto de estudo a história dos cursos superiores de Matemática da Universidade Católica de Goiás e da Universidade Federal de Goiás, mostrando como se deu a criação, implantação e consolidação de cada um durante estes quarenta anos de existência. O estudo apontou para o fato de que o curso de Matemática da UCG sempre teve como objetivo formar professores, enquanto o da Federal iniciou mais voltado para o bacharelado e só na última década passou a valorizar a licenciatura.
Palavras – chave: Criação, consolidação, missão,
reformas.
O CURSO DE MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS
Segundo as fontes pesquisadas, os cursos da Universidade Católica de Goiás, nesses 43 anos de sua existência, marcaram a história de Goiás, com a missão de formar profissionais capacitados e comprometidos com a solução dos problemas da sociedade na qual se inserem, procurando construir um estado, uma região e um país com melhores condições de vida. Não foi diferente com o curso de Matemática, objeto desta pesquisa, que foi criado também com essa missão.
O curso de Matemática
da Universidade
Católica de
Goiás foi criado em 1961,
na então
Universidade de
Goiás e
reconhecido pelo
Decreto nº 64.785,
de 4 de julho de 1969[1].
Na época
da criação,
o reitor
era o
padre Paulo de Tarso Nacca, no entanto, na voz dos entrevistados,
um dos idealizadores do curso foi o
professor José
Miguel Pereira
de Souza. Depreende-se que vários
foram os mentores intelectuais desse
curso, mas,
sem dúvida, coube ao prof. José Miguel a tarefa de articular a sua criação.
Inicialmente foram buscadas as origens do curso,
e cabe uma indagação: por
que criar um curso de Matemática em Goiás?
No diálogo com as fontes, várias foram as respostas destacando-se a
necessidade de formar professores qualificados para atender à demanda do ensino
médio e
do ensino superior, considerando que naquela ocasião, o estado de Goiás,
contava com apenas três pessoas bacharéis
em matemática e apenas um, o professor Ary Pereira da Silva, residia em Goiânia
e se dedicava ao magistério.
A habilitação dos
professores para o magistério era feita apenas na capital do estado e se dava
pelo curso criado pelo Ministério
da Educação e Cultura denominado CADES[2]
que nada mais era do que uma medida paliativa para qualificar os professores do
ensino secundário e médio sem qualificação em nível superior. O curso era
ministrado nas férias por professores que possuíam curso superior e os
participantes aprovados recebiam licença para exercer a profissão de
professor. O criador do curso de Matemática da UCG, o professor José Miguel,
foi um dos professores do curso CADES que veio e ficou em Goiânia, atendendo ao
convite do então político e seu ex-colega da escolada Escola Militar do
Realengo Mauro Borges.
Em Goiás, a década de 1960 teve como marca no ensino superior a carência de professores titulados, o que não foi diferente no processo de criação do curso de Matemática da UCG constatado na fala do professor Orlando de Castro em sua entrevista:
É para discutir
as licenciaturas
em Goiânia,
eu disse
que é
necessário voltar
ao curso
secundário pelo seguinte: não
havia Faculdade de
Filosofia em
Goiânia e
quando a
Faculdade de
Filosofia foi criada, ela
criou apenas alguns cursos: o
curso de Letras e eu creio que o de Geografia e História
e os cursos de Ciências como Matemática e Física e outros não foram
criados. O pessoal em Goiânia precisava
de aulas.
O Liceu, nesse tempo, era um colégio muito famoso , muito bom e
eficiente na época. Os
professores do Liceu eram médicos que lecionavam Biologia,
advogados que lecionavam Português e Latim, padres
que lecionavam Filosofia e engenheiros
que lecionavam Física e Matemática.
Os professores eram então pessoas formadas
mas sem
licenciatura. (entrevista
com o prof. Orlando de Castro, em 18
out. 2002)
Portanto a necessidade de formar professores de Matemática, aliada ao
idealismo de muitos, foram vetores importantes na luta pela criação do curso
de Matemática da UCG.
Para melhor
compreensão do
nosso objeto
de estudo
é necessário
ressaltar que
o curso
de Matemática
da UCG (1961)
teve início na
Faculdade de Filosofia
Ciências e
Letras da Universidade de
Goiás (FFCL) que foi criada em
1948 e reconhecida em 1949 (UCG/.Anuário 1976). Começou a funcionar nas salas
do Colégio Santo Agostinho sob a direção do bispo Dom Abel Ribeiro Camelo.
Depois, passou para o antigo prédio do Departamento de Filosofia e
Teologia (FIT) que segundo a memória da professora Kazue Yamaguchi
era um prédio cor-de-rosa e o único da Universidade de Goiás.
Em 1960, a FFCL contava com oito cursos e nesse ano foram criados mais três: o de Filosofia, o de Matemática e o de Física. Nessa ocasião, o diretor da Faculdade era o padre Luiz Tomasi e o reitor da Universidade de Goiás, o padre Paulo de Tarso Nacca. A Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da UCG estruturava-se com um diretor da Faculdade e um coordenador específico de cada curso. O primeiro coordenador do curso de Matemática e Física foi o professor José Miguel Pereira de Souza.
Com a
Reforma Universitária
de 1968,
a UCG, em 1972,
teve que optar pela departamentalização,
como registra Martins (2002, p.
171-172): “Desde o
princípio de 1970, a Universidade Católica de Goiás iniciou o processo
gradativo de implantação da Reforma Universitária, sob o reitorado do Padre
Cristóbal Álvares Garcia, procurando definir-se por um projeto compatível com
os pressupostos da própria reforma”
A Reforma Universitária de 1968 trouxe as seguintes modificações
internas: a) a departamentalização ; b) a matrícula por disciplina; c) o
curso básico; d) a
institucionalização da pós-graduação.(RIBEIRO, 1978, p. 193)
Como já foi registrado anteriormente,
a carência de professores de Matemática em Goiânia, na época da criação
do curso de Matemática, era muito grande e as aulas eram dadas por engenheiros.
Após a formatura da primeira turma de Matemática, o curso passou a se
retroalimentar, ou seja, os alunos que
se destacaram no curso e tinham interesse pelo
ensino passaram a constituir o quadro de professores do curso, porém na
década de 1970, o quadro mudou um pouco, uma vez que os professores do curso de
Matemática da UFG passam a lecionar também na UCG.
As reformas curriculares foram
freqüentes, e o curso de Matemática da UCG
passou por várias mudanças no que diz respeito ao regime e ao
currículo. Para melhor organizar esta exposição, pretende-se sistematizar
essas mudanças desde a criação do curso.
Na década de 1960, o curso
começou a funcionar no regime anual (seriado) em quatro anos,
formando bacharel e
licenciado, segundo a professora Kazue Yamaguchi: “A gente fazia três anos de
bacharelado e depois um ano de
licenciatura que era
dentro da área de educação:
psicologia, Sociologia, Filosofia da Educação, Administração Escolar”
(entrevista em 2002)[3].
O curso de Matemática, nessa época, funcionava na antiga Faculdade de
Filosofia Ciências e Letras da Universidade de Goiás e havia muitas aulas
comuns a todos os cursos, e até mesmo a colação de grau e a formatura eram de
todos os alunos do curso da FFCL, conforme informação de vários
entrevistados.
Três fatos interessantes foram registrados pelos entrevistados a respeito
daquela época. O primeiro diz respeito aos professores das disciplinas pedagógicas,
que iam às escolas nas quais os alunos do curso de Matemática lecionavam, para
orientá-los, corrigindo suas falhas, prestando uma verdadeira assessoria pedagógica.
Os professores também cobravam planos de aulas dos monitores, como se eles
tivessem ministrando aulas; tais atitudes, na visão dos depoentes, foram muito
positivas para a sua formação. Outro fato diz respeito à localização da
universidade. As ruas não eram asfaltadas e na época de chuva era quase impossível
o acesso à universidade, pois o ponto final dos ônibus localizava-se no centro
da cidade, e a universidade situa-se no Setor Universitário, distante do
centro. O terceiro foi comunicado na entrevista da professora Terezinha Carvalho
Cortês. No início do curso de Matemática (1961), se o candidato ao curso
fosse professor por mais de dois anos, estava dispensado do exame vestibular.
Esse incentivo vem confirmar a tese de que a carência de professores
habilitados em Matemática foi um dos pontos fortes para a sua criação na UCG.
Em 1972, no 1º semestre, iniciou-se
o regime de créditos, para atender
às exigências da reforma universitária de 1968. O curso de Matemática
conferia o título de licenciatura plena em Matemática aos seus graduados.
Torna-se significativo ressaltar que o regime de créditos, a matrícula
por semestre, a organização dos departamentos, a divisão do currículo
escolar em ciclos básico e profissionalizante, implementados em 1972,
vieram reforçar os interesses da política repressiva
gerada pelo golpe de 1964. Em 1969, veio à tona mais um ciclo
repressivo, conforme afirma Germano (2000, p. 11). Trata-se de uma época por
ele denominada de evasão de cérebros, pois com o Ato Institucional
nº5 (AI-5), grande número de professores universitários brasileiros
evadiram-se para o exterior.
Em meados da década de 1970,
foi estabelecido um novo currículo para adaptação dos cursos de licenciatura
em Matemática e licenciatura em Física para a licenciatura em Ciências, com
habilitação em Matemática ou Física ou Biologia, com base na Resolução nº
30/74 do então Conselho Federal de Educação (Brasil. CFE, 1974). O aluno
prestava o vestibular para o curso
de Licenciatura Plena em Ciências e
depois de dois anos optava pela habilitação em
Matemática, Física ou Biologia. O curso tinha duração média de
quatro anos.
O objetivo almejado pelo currículo
de habilitação em Matemática
era: “exercer funções do magistério,desenvolver princípios e técnicas
aplicáveis à intensificação
científica das ciências exatas, assessorando também outros especialistas
desses campos particulares” (UCG, anuário
1976, p.81).
No cotidiano da implantação desse currículo, os
alunos manifestaram um
grande descontentamento pelo currículo
do curso, pois o núcleo comum
oferecia muitas disciplinas fora do
contexto da habilitação pretendida, causando prejuízo às
disciplinas específicas
que acabavam por
ficarem reduzidas. O professor Hélio Correa assinala os efeitos da
reforma curricular:
veio
o currículo de Ciências que aí ficou aquela coisa meio esquisita, virou uma vitamina de
conteúdos e quase tudo na mesma dosagem. O
aluno de Matemática, por exemplo, tinha muita Geologia, tinha muita Biologia
e pouca Matemática, pouca Física para o curso de Física,
pouca Biologia
para o curso de Biologia. (Entrevista em out. 2002).
O curso de Licenciatura Plena em Ciências foi se
enfraquecendo em virtude de vários fatores, como a não-garantia de formação
científica e pedagógica adequada, a oferta de disciplinas fora da área da
habilitação, o baixo índice de procura nos vestibulares,
o grande número de evasão e de transferência para outros cursos,
levando a congregação do Departamento de Matemática e Física (MAF)
a iniciar, em 1986, o estudo da reforma curricular,
conforme consta no processo já citado.
O novo projeto propunha formar alunos licenciados em Matemática ou em Física,
com conhecimento aprofundado nas disciplinas específicas de cada habilitação,
isto é, um professor de primeiro e segundo graus competente e transformador da
realidade social e com melhores oportunidades diante do mercado
de trabalho.
Alguns dos objetivos dessa reforma estão expressos no projeto:
Os
novos currículos para os cursos de
Matemática e Física deveriam ser capazes de propiciar ao estudante condições
de:
-
tornar um professor de 1º
e 2º graus competentes no sentido de orientar adequadamente o processo de
ensino , estudo x aprendizagem
-
ter domínio dos conteúdos que lhe permitam apresentar um bom
desempenho naquela que for sua opção profissional ( professor/pesquisador/...)
-
obter melhores oportunidades frente ao mercado de trabalho
-
desenvolver no estudante de 1º e 2º graus uma consciência crítica e
um espírito cientifico. (UCG, 1997. Processo UCG/MAF/VA 004/87).
Na avaliação de alguns professores essa proposta era positiva, pois
oferecia ao aluno do curso uma formação com maior conteúdo específico da
Matemática o que acarretaria melhores condições para atuação do futuro
professor, com “formação adequada da criança do adolescente e do futuro
profissional”(UCG, 1987. Processo UCG/MAF/VA004/87), porém, depois de
aprovado e colocado em prática, não conseguiu atrair e manter os alunos na
licenciatura em Matemática.
Os dois primeiros anos da década de 1990 foram de profunda crise nas
licenciaturas, não só em Goiás, mas
no Brasil, conforme relata Brzezinski (1997, p. 60):
No início da década de 90,
no entanto, o modelo de formação de professores, construído na década
anterior, já não respondia às exigências da contemporaneidade. O modelo se
exauria como reflexo do histórico desperdício dos cursos de Licenciatura na
universidade e da falta de respostas desses cursos às rápidas transformações
tecnológicas e sociais por que passam o país e o mundo. Exauria-se também o
modelo, em decorrência do descaso com que as políticas públicas tratam a
questão educacional e da sistemática desvalorização social e econômica
imposta pela sociedade capitalista brasileira ao profissional da educação.
Havia a crença de que as
licenciaturas , incluindo a de Matemática, deveriam fechar em razão da grande
evasão e pouca procura pelo curso. Esses problemas eram comuns a todos os
cursos de licenciatura da UCG.
Diante desses problemas, o desafio consiste em elaborar uma proposta que
tornasse o curso mais atraente e, ao mesmo tempo, competitivo.
Uma nova reforma curricular ocorreu em 1994, assim como em todos os cursos
de licenciatura da UCG, conforme relata Brezezinski (1997, p. 69):
O
Colegiado das Licenciaturas, a partir de 1993, passou a construir,então, uma
proposta inovadora de formação de professores, bacharéis e especialistas,
mediante um trabalho coletivo e interdisciplinar. Construía-se uma nova política
para as licenciaturas da UCG. Essa política pretende formar um profissional
fundamentalmente preparado para o trabalho pedagógico da escola de 1º e 2º
graus.
A reforma de 1994 aconteceu
numa época em que as licenciaturas passavam por uma crise muito grande.
Vários cursos foram até ameaçados de fechar em virtude da baixa
procura. Para
muitos o projeto dessa reforma foi, na época, futurista e de grande
valia para a formação de professores, pois
trazia propostas novas, como
as disciplinas chamadas interdisciplinares,
oferecidas a todos os cursos, e com o objetivo de ampliar o conhecimento
dos alunos e efetuar uma verdadeira interdisciplinaridade entre os conteúdos
dos cursos.
No projeto das licenciaturas, a integração do curso
deveria acontecer no oitavo
período com a especialização,
mas, no decorrer do tempo, vários alunos não sentiam motivação pelos cursos
oferecidos pelo colegiado das licenciaturas. Várias mudanças aconteceram no
oitavo semestre, com o objetivo de atrair os concluintes das licenciaturas.[4]
Atualmente, portanto, na avaliação de vários professores da UCG, a
reforma de 1994 já não atende às necessidades do curso de Matemática para a
formação de seus alunos.Dentre os fatores apontados pelos críticos da última
reforma a reclamações quanto às disciplinas chamadas interdisciplinares, que
perderam o sentido de formar um aluno com uma visão mais ampla de conteúdos e
representam um número expressivo de 14 créditos durante o curso, é uma tônica
forte além da preocupação com a expansão recente do ensino superior em Goiás,
especialmente com a abertura de 48
cursos de Matemática nas IES privados e públicas, que oferecem cursos rápidos
e a maioria grátis.
O CURSO DE MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE
GOIÁS
Antes da reforma universitária
de 1968, os cursos de Matemática, no Brasil, pertenciam às Faculdades de
Filosofia Ciências e Letras (FFCL), o que não foi diferente na Universidade
Federal de Goiás e, por isso mesmo, esta discussão inicia-se com a constituição
da FFCL/UFG.
A criação da FFCL/UFG começou a ser discutida em reunião do dia 25 de setembro de 1962, quando se reuniu no gabinete do reitor, em sessão ordinária, o Conselho Universitário para, dentre outros assuntos, tratar da criação, instalação e funcionamento da Faculdade de Filosofia da Universidade Federal de Goiás. O magnífico reitor, Colemar Natal e Silva, presidente do conselho, fez a defesa da criação da referida faculdade afirmando ser ela “núcleo central em torno do qual gravitarão muitas de nossas atitudes” (UFG, 1962). Traçou, também, um esquema de funcionamento para a instituição:
a) em
1963, funcionarão
as primeiras
séries dos
cursos de
Matemática, Física,
Pedagogia e
Letras Neo-latinas;
b) em 1964,
funcionarão as
primeiras séries
dos cursos
de Química,
Geografia, História
e Letras Anglo-germânicas;
c) em 1965,
funcionarão as
primeiras séries
dos cursos
de Filosofia,
Ciências Sociais,
Letras Clássicas
e História
Natural” (UFG, 1962)
Por meio de várias vozes,
reconstrói-se também a história da criação do curso de Matemática da UFG.
Abrindo as gavetas de sua memória, em entrevista, o professor Orlando Ferreira de Castro (entrevista em 18 out. 2002), diz que a discussão sobre a criação da FFCL já era uma realidade entre os docentes da UFG:
Em 1961
o professor Colemar, que
era reitor,
baixou uma
portaria nomeando
uma comissão
para instalar
a Faculdade
de Filosofia
da Universidade Federal. Se
não me
engano, o
nome dos
componentes desta
comissão eram:
o professor
Egídio que
era o
líder da
comissão, o professor
Genesco Bretas,
a professora
Floraci Rebouças
do Amaral,
a professora
Genesi de
Castro e
Silva e
eu. Nós
reuníamos geralmente no consultório do
Dr Samir
Helou, que
ficava no
Edifício Inhumas,
na Avenida
Anhangüera, esquina
com a
Rua 6, e
que existe
até hoje.
Em frente,
funcionava o
Bar Royal. Era um
bar chique
da cidade naquela época e
aos domingos
não podíamos
nos reunir
no consultório
do Dr
Samir, então
nós reuníamos
a comissão
lá no Bar Royal.
Ali nós
fazíamos tudo,
como programas
das disciplinas,
currículos e
principalmente discutia
quais eram
os cursos
que a faculdade de
Filosofia devia
ter” (Orlando de Casto, entrevista em 18 out. 2002).
Em sua fala, o professor Orlando de Castro (entrevista em 18 out. 2002) destaca a discussão que havia naquela época sobre a necessidade dos cursos na área de exatas:
Um dos
cursos que
mais fazia
falta eram
os chamados cursos de
Ciências Exatas,
ou seja,
Física e
Matemática. Então
ficou decidido
que esses
cursos seriam
criados. No
meio daquelas
reuniões, antes
mesmo de
criar a
Faculdade de
Filosofia por
lei, por
um decreto
do Presidente
da República,
foi feita
a distribuição de departamentos e
eu fui eleito
o chefe
do Departamento
de Matemática
e Física
inclusive para
montá-lo. Convidei
para lecionar
no departamento
os professores
da Escola
de Engenharia,
porque não
havia outros
naquela época.
Os professores
eram: o professor Saleh Jorge Daher
pra lecionar
Cálculo, o
professor Irapuã
Costa Júnior
que foi
lecionar Física,
o professor
Jânio Marcos
Cohen que
depois passou
a lecionar
Cálculo, o
professor Eurico
Godoy que
foi lecionar
Desenho e
eu que fui
lecionar Cálculo
Vetorial.
Vários foram os idealizadores e construtores do Instituto de Matemática e Física da Universidade Federal de Goiás. Dentre as indagações levantadas pela pesquisa, uma refere-se ao perfil de diretores e professores do curso de Matemática da UFG, assim como no curso de Matemática da UCG. Dentre as muitas atuações relevantes, destaca-se a do professor Gabriel Roriz, mineiro de São João Del Rei, engenheiro que veio para Goiás com o objetivo de trabalhar na estrada de ferro em Araguaína, município que atualmente pertence ao estado do Tocantins. Depois foi transferido para Goiânia, quando o Clube de Engenharia resolveu criar a Escola de Engenharia do Brasil Central. Embora tenha ajudado a criar a faculdade, não atuou como professor nos primeiros anos, mas foi o seu primeiro diretor depois dela ter sido encampada pela recém-criada Universidade Federal de Goiás, segundo seu depoimento . Preocupado com a qualidade do ensino ministrado na Faculdade de Engenharia, buscou ajuda em outros estados.
Roriz (entrevista em 22 jan. 2003), assim representa e interpreta sua atuação nesse processo:
Sentia
que a situação da escola era muito precária,
que o nosso nível era muito baixo . Naquela época a gente não contava
com nenhuma ajuda para sair, para despesa com viagem. Então, por minha conta,
eu fui a Belo Horizonte tomar umas informações da Escola de Engenharia da
universidade de lá. Estive em Juiz de Fora e em Itajubá, enfim fui coletando
uma série de dados. Escrevi para várias escolas
de engenharia, pedindo cópias
do regimento porque achávamos que o nosso estava precisando de uma reforma. Nós
tínhamos um problema que, para mim, era grave pois nós éramos engenheiros
exercendo a profissão improvisada
de professores.
É bom destacar que o curso de Engenharia oferecia dois anos do denominado ciclo básico, e depois havia as disciplinas da parte profissionalizante, com três anos. Fica registrado na voz do professor Gabriel Roriz a dificuldade de trabalhar com professores qualificados para atuar nos cursos recém-criados e as alternativas encontradas para superar esse problema:
Naquela época a Engenharia tinha dois anos básicos
e três profissionalizantes que só
serão bem feitos se houver um bom curso básico, evidentemente. Na parte
profissional nós tínhamos professores que dominavam bem o seu ramo,
mas acontece que faltava a base. Nesse
meio tempo, eu tive notícias, através do professor Gerson Guimarães, que
tinha sido diretor da Escola de Engenharia do Brasil Central, do professor
Oliveira Junior, que tinha sido um dos criadores do ITA (Instituto Tecnológico
da Aeronáutica) de São José dos Campos, e que na época era presidente da
Comissão Supervisora dos Institutos e cuja missão era sair pelo Brasil afora
visitando principalmente as escolas de Engenharia
para desenvolver as idéias da criação dos institutos, como o professor
de tempo integral, especialista na área. Então eu convidei o professor
Oliveira Junior para fazer uma palestra para os alunos e professores da
Faculdade de Engenharia. Quando terminou a palestra, eu disse ao professor que
tinha adorado as sua idéias e perguntei o que deveria para começar a implantá-las.
Aí, então ele tirou do bolso um cartão e escreveu o nome do professor Paulo
Pompéia, do ITA, para que eu o procurasse. Eu peguei o carro por minha conta, e
fui a São José dos Campos. (Gabriel Roriz, entrevista em 22 jan. 2003).
Além de professores, outras alternativas eram buscadas para a melhoria do curso, como eventos que eram constantemente promovidos pela Faculdade de Engenharia da UFG. Esses eventos eram utilizados também para com professores de outros estados, em um deles, o professor Lacaz Neto, que era chefe do Departamento de Matemática do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), esteve em Goiânia com um grupo de alunos e proferiu uma palestra para os alunos e professores da UFG. Foi então convidado para ministrar aulas na UFG, o que acabou não acontecendo, mas abriu possibilidades para a busca de professores qualificados naquela instituição. A partir desse contato, o professor Gabriel Roriz novamente foi ao ITA e convidou o professor Paulo Pompéia, que indicou o professor Leônidas para organizar e dirigir o Instituto de Matemática, e o professor João Martins, para o de Física .
Havia grupos que queriam a criação do instituto e outros que eram contra. Na interpretação de Gabriel Roriz, a campanha contra a criação do instituto extrapolou os muros da UFG e foi para a imprensa, e um grupo rival, aos domingos, apresentava um artigo tentando mobilizar a sociedade contra a criação do instituto.
O professor Gabriel Roriz retomou a tarefa de encontrar um professor qualificado e com desejo de criar os institutos. Voltou a São José dos Campos e pediu ajuda ao professor Paulo Pompéia que indicou o professor Willie Alfredo Maurer que era diretor da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade Mackenzie (Mack-SP). Como diretor da Faculdade de Filosofia, desejava, no início, que os cursos de Matemática e Física continuassem ligados a ela, mas foi convencido a criar um instituto que abrigasse esses cursos. Ele teve papel decisivo na criação do Instituto de Matemática e Física, pois foi o autor do projeto e seu primeiro diretor.
Apesar da existência de grupos favoráveis e contrários, e após muitas disputas, ocorreu a criação do Instituto de Matemática e Física da UFG, pelo Conselho Universitário, em 23 de outubro de 1963, e reconhecido pelo governo federal, em 15 de dezembro de 1969, pelo Decreto nº 65.874 (Brasil, 1969).
Outro problema que este trabalho se propõe a
discutir é se, na UCG e na UFG, a Matemática superior foi implantada não só
para formar professores, mas também
como suporte da Engenharia. Evidencia-se, pelo teor das entrevistas e dos
documentos que na UFG, o
Instituto de
Matemática e Física nasceu para
atender às necessidades da Escola
de Engenharia. Foi criado também
tendo como paradigma o Instituto
Tecnológico da
Aeronáutica (ITA),
na época escola modelo para
os cursos de Engenharia,
como fala
o professor Juarez
Milano (entrevista em 5 jan. 2003):
O Instituto de
Matemática e
Física, ele
tem o sentido de
extrair o
espírito do
ITA, porque
em 1963, a Faculdade
de Engenharia
da UFG sentia
falta de
professores de
Matemática, de
Física porque
havia só
engenheiros. (...) e, então a escola de Engenharia
tinha necessidade de professores de Matemática e Física. Acontece
que o
professor Gabriel
Roriz, diretor da escola, muito
idealista, muito
bacana, ele queria
fazer da
Escola de
Engenharia alguma
coisa muito
importante. Então
ele foi
ao ITA
porque o
ITA era
uma escola
de excelência
em Engenharia.
Vim para
cá junto
com o Willie Maurer,
com o
Gabriel Roriz, com
Sérgio Schineider, juntos com
outro professor
que trouxe
de lá pra cá,
nós começamos
a criar
o Instituto
de Matemática
e Física,
no espírito
do ITA. Eu optei vir para cá
porque o projeto que tinha aqui era
o mesmo que eu tinha dentro de mim porque eu fui criado profissionalmente dentro
do ITA. Era um trabalho em equipe, o professor começava como
auxiliar, depois professor assistente, professor adjunto e professor titular.
Era uma progressão que você fazia através
dos títulos que você ia conseguindo.Havia um sentido de equipe e de amizade e
havia também o código de ética do ITA. Então nós colocamos o tempo
integral, dedicação exclusiva como era np ITA e na Faculdade de Filosofia Ciências
e Letras do Mackenzie . Esse espírito alguns professores aceitaram e outros não.
O curso de Matemática do IME da UFG forma licenciados e bacharéis desde a sua criação. Na voz da maioria dos entrevistados, atualmente, há um equilíbrio quanto ao número de alunos que optam por licenciatura ou pelo bacharelado, mas, no início do curso, a licenciatura quase inexistia, conforme a voz da professora Shirlei Serconec (entrevista em 27 nov. 2002):
Eu acho que o IME atua em ambas as frentes porque com o
estabelecimento do regime anual, se você for olhar a produção do curso de
licenciatura aumentou muito e como nós temos mestrado,
a existência dele puxou naturalmente a qualidade do bacharelado que é
um curso que não deixa nada a desejar a nenhum outro curso. Nossos alunos são
capazes de fazer doutorado em qualquer escola no Brasil e até mesmo fora dele.
Quando se iniciou o curso de Matemática (1963), segundo o professor Ailton José (entrevista em 12 dez. 2003), o aluno não distinguia entre licenciatura e bacharelado. Ele cursava as disciplinas e, quando se formava, havia concluído tanto a licenciatura quanto o bacharelado. Já na época da professora Gisele de Araújo, a licenciatura estava tão em baixa que os alunos nem sabiam da sua existência. É bom destacar que a crise das licenciaturas ocorreu também em todos os cursos da UFG, assim como na UCG, exatamente no mesmo período. Atualmente, quando começa o terceiro ano, o aluno tem que fazer opção pelo bacharelado ou pela licenciatura. Na voz da professora Gisele de Araújo (entrevista em 11 abr. 2003), o reconhecimento da licenciatura ocorreu assim:
No
início da década de 80, os professores Mauro
Urbano e Ana Amélia estavam
preocupados com a licenciatura em Matemática.
O Mauro começou a participar de um grupo do qual não me lembro do nome.
Esse grupo começou a mudar a cara das licenciaturas dentro da Universidade.
Eles tiraram o Colégio de Aplicação de dentro da Faculdade de Educação
e colocaram junto da Reitoria. Criaram o Fórum das Licenciaturas. O Fórum deve
ter começado a funcionar nos anos 90, 91, mas antes disso já tinha esse grupo
que fez essas mudanças inclusive a professora Zaira veio para o departamento,
criou o Laboratório de Educação Matemática.
O nosso currículo mudou em
1984, quando nós passamos para o regime seriado anual.
Todos esses fatores contribuíram para
o fortalecimento da licenciatura.(...). Na terça-feira próxima passada
tivemos colação de grau de 51 alunos do curso de Matemática sendo 38 da
licenciatura e 13 do bacharelado.
É importante ressaltar que, na década de 1970, a UFG, como todos os setores educacionais e a sociedade brasileira, entravam na luta pela valorização e preparação dos educadores, desencadeando, em 1980, a formação do Comitê Nacional Pró-Formação do Educador, com sede em Goiânia. Nesse mesmo ano, foi realizado na UFG o I Seminário sobre as Licenciaturas, que propunha a reformulação das licenciaturas na UFG. Como fruto do seminário, começou intensa discussão no meio acadêmico e estudantil que teve como primeira conseqüência a mudança do regime de créditos semestral para o sistema de séries anuais, o que se deu em 1984.
O crescimento do número de alunos que optavam pela licenciatura em Matemática, segundo a professora Gisele de Araújo (entrevista em 11 abr. 2003), deu-se graças aos fatores já expostos e ao trabalho desenvolvido pelos professores, com objetivo de valorizar e acompanhar seus alunos desde o seu ingresso, pois, na sua época de aluna, as turmas do curso de Matemática faziam suas disciplinas juntamente com os alunos de Engenharia, Química, Física e Computação. Segundo ela, “os alunos de Matemática ficavam escondidos no meio dos de outros cursos e somente no terceiro e quarto anos eles começavam a ter a sua identidade”.
Porém, com a criação do sistema seriado, em 1984, as turmas separaram-se e, com isso, os alunos do Curso de Matemática mostravam o seu perfil desde o início do curso, permitindo, assim, um acompanhamento de perto pelos professores.
Em 1989, a UFG realizou o II Seminário de Licenciatura que continuou com o mesmo ideal do primeiro: rediscutir o projeto de formação de educadores. Foi criado um grupo de trabalho, em 1990, para estudar e propor mudanças para os cursos de Licenciatura, e uma das propostas apresentadas era a de criar o Fórum das Licenciaturas da UFG.
O fórum era formado pelos coordenadores dos cursos de Licenciatura da UFG , pelo diretor do Colégio de Aplicação e pelo chefe do Departamento de Fundamentos e Prática de Ensino da Faculdade de Educação, conforme relatos de SANTOS (1999, p. 35).
Santos (1999) aponta que, segundo Föereste (1995), o Fórum de Licenciatura passou por três momentos: o da empolgação, em que todos os cursos de licenciatura participavam das discussões; o de desânimo, quando as didáticas e práticas de ensino tinham saído da Faculdade de Educação e estavam nos institutos, e o terceiro, de descaso pelas discussões das licenciaturas.
Segundo Santos (1999, p. 37),
o curso de Matemática promoveu uma reformulação curricular iniciada em 1993,
proposta pelo Fórum das Licenciaturas. Nessa reforma, foi criada a
disciplina Metodologia e Conteúdo do Ensino de Matemática, e a disciplina Prática
de Ensino de Matemática foi integrada ao Departamento de Matemática da UFG
que, na voz de alguns entrevistados, foi um marco expressivo para o
fortalecimento da licenciatura no curso de Matemática.
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agosto/1967.
_____. Informativo UFG,
outubro/1967.
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_____. Informativo UFG, janeiro/1969.
[1] Dados obtidos na Coleção Memória/UCG
[2] Campanha de Aperfeiçoamento e Difusão do Ensino Secundário
[3] Informação corroborada pelo professor Augusto Cézar, entrevista em 10 de nov. 2002
[4]
Para 2003, segundo
semestre, está previsto um curso de especialização em Ciências Exatas e
Biológicas, na expectativa de atrair os concluintes, sobretudo da área de ciências.